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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Representação das Mulheres no Brasil Colonial


Por: Marcia Regina de Souza


Para a sociedade colonial, o conjunto dos fenômenos da vida sexual da mulher deveria servir apenas à reprodução dentro do matrimônio, bem como desprovido de paixão amorosa, erotismo. Em contrapartida, a sexualidade do homem poderia ser entremostrada, desde que não constrangesse a sociedade e nem desamparasse sua família, ficando a passividade restrita à mulher, numa condição de subserviência ao homem. Assim, a prevenção somava-se à repressão para impedir o despertar da sexualidade feminina, o que propiciava a veiculação e, muitas vezes, as cristalizações do estereótipo feminino.
 
Nesse contexto, tanto a Igreja quanto o Estado corroboraram para naturalizar essa condição para a mulher, pois na visão de ambas as instituições: homem e mulher deviam se unir pelo casamento, bem como tinham a obrigação de procriar, fatos que complementariam os projetos à constituição de uma sociedade organizada. Diante disso, o papel da mulher se restringiu a funções, de maneira que “a função biológica da mulher (reprodutora) estava ligada à outra função moral e metafísica: a mulher deveria ser mãe e, sendo mãe, deveria ser frágil e submissa” (SZESZ: 2011, p.73).
 
Diante disso, o casamento serviria para consolidar relações de amizade entre as elites e para salvaguardar bens territoriais das famílias. Além disso, o matrimônio simbolizava um grau de prestígio perante a sociedade, fazendo a diferenciação na hierarquia social. O que pôde ser constatado no filme Desmundo (2003) quando Francisco (Osmar Prado):
  
(...) não está disposto a perder sua esposa, pois precisa limpar seu nome perante Deus e a sociedade, ter, então, um filho com Oribela, uma mulher branca e portuguesa, é uma possibilidade de ser perdoado por seu pecado (incesto) e poder sair da reclusão em que vive. Francisco não luta, desta forma, por seu amor e sim por sua honra masculina, social e religiosa. (OLIVEIRA: 2008, p.6)
  
Nessa condição social, a mulher experimentava, ao mesmo tempo, uma realidade ambivalente, já que, por um lado, deveria ser virtuosa perante a sociedade e, por outro, necessitava de liberdade e independência para extravasar seus sentimentos e sexualidade, desejando transgredir o estereótipo que lhe fora imposto. Diante disso, a revelação do desejo e/ou quaisquer forma para exercitar e satisfazer sua sexualidade seriam consideradas crimes perante as Leis do Estado, da Igreja e da sociedade.
 
No entanto, algumas mulheres não aceitaram “passivamente a subordinação aos valores misóginos e sobretudo às determinações da Igreja” (ARAÙJO: s/d, p.53), bem como recorreram a estratégias tanto como forma de reação quanto para se satisfazerem sexualmente. Assim, entre elas está o adultério, que, no período colonial, tornava-se muito arriscado à mulher, porém “os refúgios do pecado eram os de sempre, o mato, a rede, a cama, mas as ocasiões variavam” ((ARAÙJO: s/d, p.60). Outras reações/estratégias eram a fuga e a clausura do convento, às quais facilitavam uma aproximação entre as mulheres como forma de se ampararem no amor, umas com as outras, ou seja, levando-as a praticarem o homossexualismo, já que
 
“(...) A troca de informações, a difusão de saberes restritos ao cotidiano feminino davam às mulheres ocasião, “em certa medida”, de criar um mundo feminino, expressado em laços de solidariedade e amizade entre vizinhas, amigas e parentes, nos expedientes alternativos de esperança e num poder informal e difuso”. (ARAÙJO: s/d, p.54)
   
Além disso, o fato de as mulheres viverem em clausura facilitava à disposição a infringir os costumes, pois
 
“Longe do olhar paterno e da vigilância de vizinhos, a jovem e vaidosa freira passava a integrar uma corporação das mais fechadas, com suas próprias regras e transgressões, cuidadosamente reguladas. Assim, a sexualidade reprimida em casa podia agora se extravasar de mil maneiras, algumas sutis, engenhosas, ardilosas mesmo, outras sem maior rebusco, sem cuidado, sem pudor algum. (ARAÙJO: s/d, p.69)
  
Em decorrência do exposto, assim como o filme Desmundo (2003), este estudo procurou desmistificar a imagem de mulher “frágil, delicada e submissa” constituída ao longo do período colonial, já que “(...) a Igreja e a medicina representaram conjuntamente as instituições que, de modo significativo, estabeleciam o sentido e o lugar da mulher” (MENDONÇA & RIBEIRO: 2010, p.01) por meio da utilização de discursos moralizantes, bem como da violência para a construção, reconstrução e cristalização da identidade social feminina e sua condição, bem como este conceito assegurava a dominação masculina sobre as mulheres.
 
Portanto, farei uso das palavras de Oliveira (2008, p.07) “A igualdade de gênero deve ser trabalhada na escola, para reverter a cultura que aqui foi impregnada e o cinema é uma ótima forma de se realizar esse trabalho”, já que são por meio das práticas discursivas que se faz com que os indivíduos, menos preparados, pertencentes à sociedade, concebam como “naturais” os discursos preconceituosos ligados a valores discriminatórios, neste caso relacionado à mulher.

  

 

 Referências:

  

 ARAÚJO, Emanuel. A arte da sedução: sexualidade feminina na Colônia. In: A História das Mulheres. Material disponível em: Plataforma AVA/UEPG 2011.

  
MENDONÇA, João Guilherme Rodrigues; e RIBEIRO, Paulo Rennes Marçal. Algumas reflexões sobre a condição da mulher brasileira da colônia às primeiras décadas do século XX. In: Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação. v.5, n.1 (2010). Disponível em: Acesso em 22-04-2010 às 09h: 27mn.

  
OLIVEIRA, Diovana Ferreira de. Desmundo: o cotidiano da mulher no Brasil colonial: uma análise cinematográfica. In: Anais do II Encontro Internacional de História Colonial. Mneme – Revista de Humanidades. UFRN. Caicó (RN), v. 9. n. 24, Set/out. 2008. ISSN 1518-3394. Material disponível em: Plataforma AVA/UEPG 2011.

  
SILVA, Tânia Maria Gomes da. Trajetória da historiografia das mulheres no Brasil. In: POLITEIA: Hist. e Soc., Vitória da conquista, v.8, n. 1, p. 223-231, 2008. Material disponível em: Plataforma AVA/UEPG 2011.

  
SZESZ, Christiane Marques. História do Brasil I. (Orgs.) Christiane Marques Szesz, Maura Regina Petruski e Renato Lopes Leite. Ponta Grossa: UEPG/NUTEAD, 2011.

  
Desmundo (filme). Direção Alain Fresnot. Duração: 100 min. Brasil. Atores: Simone Spoladore, Osmar Prado, Berta Zemei, Beatriz Segall. Gênero: Drama. Estúdio/Distrib.: Sony Pictures, 2003.

 

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